sexta-feira, 6 de janeiro de 2006

Paris no Século XX (1860-63, 1994)


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Sinopse:

"Paris do Século XX" editado pela Bertrand, é uma obra atípica do mestre, onde ele, em vez de exaltar as conquistas e façanhas do Homem na segunda metade do século XIX, cria um mundo no futuro distante - 1960 - e mostra uma Paris sufocada por prédios gigantescos, iluminada pela electricidade e electromagnetismo, uma capital entregue ao culto da ciência e tecnologia, com um povo dominado pela classe política/empresarial e inundada de burocratas, que se esqueceu das artes, da poesia e da liberdade individual. Metros suspensos e automatizados, automóveis individuais, silenciosos e não poluentes movidos a hidrogénio, enfim, uma utopia onde daria gosto viver-se, não fossem as ciências mecânicas terem o direito de cidade e os poetas e escritores estarem reduzidos à miséria e ao ridículo. De facto, a população toda ela alfabetizada, não consegue ler outra coisa senão manuais técnicos. A desculturização tornou-se realidade. Apesar do tom pessimista, Verne não deixa de mencionar e festejar os avanços tecnológicos da época do romance: o automóvel, o "fax", o computador, a comunicação instantânea e à longa distância etc. Mesmo assim, seu herói, Michel (nome que daria ao seu filho) sofre ao ver que está imerso numa Paris fria e insensível, que já não sabe mais, por exemplo, quem foi Victor Hugo. "Paris no Século XX" foi escrito por Verne bem no início de sua carreira, tinha Verne 35 anos. Foi apresentado ao seu editor, Jules-Pierre Hetzel, logo após o sucesso de "Cinco Semanas em Balão", e fugia do estilo romance-geográfico que marcou toda sua obra. O problema é que o livro tem um conteúdo depressivo, e Hetzel por carta, aconselhou o escritor a não publicá-lo na época, pois fugia à fórmula de sucesso dos livros já escritos, que falavam de aventuras extraordinárias. Verne guardou-o e jamais impôs sua publicação - mesmo no auge da fama. O manuscrito original foi apenas recentemente descoberto por um bisneto de Verne num cofre no sótão de sua casa e finalmente publicado em 1994. É uma obra atípica mas fundamental para se entender Verne. Apesar de todos os defeitos que críticos podem ter achado num livro dos primórdios de sua produção, é uma obra obrigatória. Ao mesmo tempo que exalta o espírito humano, ele mostra aqui uma total descrença no futuro - ou pelo menos, num futuro muito parecido com o que tempo em que vivemos. Isso é que é o pior... Mais uma vez, Júlio Verne mostrou-se visionário.

Poderá ler aqui no blog uma crítica escrita por Cid Seixas sobre esta obra.

3 comentários:

Ana Nunes disse...

Nunca tinha lido nada da autoria de Verne, embora como quase toda a gente conheça o seu trabalho, seja por filmes seja pela influência que os seus trabalhos tiveram noutras artes e que se vêem um pouco por todo o lado.
Daí que tenha partido para esta leitura ignorante do estilo do autor, se bem que consciente da genialidade do mesmo.

Em termos narrativos posso dizer que a história nada tem de especial. O enredo é simples e sem grandes acontecimentos, além de a trama estar contada num tom algo plácido que cria um distanciamento entre o leitor e a acção (por pouca que esta seja). Temos um comum sonhador, um poeta num futuro em que as letras estão mortas e os artistas morrem de fome.
Não posso dizer que a história em si é desprovida de interesse, pois são os acontecimentos que permitem ao leitor ver o mundo que Verne imaginou.
Pessoalmente fiquei surpreendida com o final, não por ser inesperado, mas porque em parte não acreditava que o autor fosse por esse caminho.
Por outro lado o mundo que o autor nos apresenta é rico em detalhes, pensado ao pormenor e estranhamente verossímil. Verne pode ter-se baseado nas descobertas do seu tempo para criar este futuro distópico em que as artes mirram frente ao progresso industrial, mas a verdade é que só uma mente brilhante poderia ter imaginado tal cenário há mais de 100 anos atrás. Muitos poderão argumentar que a visão futurista do autor nada tem a ver com a realidade de hoje, mas será essa a verdade? A indústria não cresce de forma exponencial? O que se faz hoje em dia sem recurso à energia? As cidades não se estendem até ao infinito, quase sem o vislumbre da natureza? Não temos nós alguns dos Invernos mais rigorosos dos últimos séculos e não estão as pessoas mais preocupadas com os lucros do que com as artes?
Em muitos pontos a visão de Verne falhou (a literatura não só não desapareceu, como está cada vez mais abrangente e chega a todo o lado), mas talvez na altura em que escreveu o livro as perspectivas não fossem muito animadoras aos olhos do autor.
O mundo que Verne criou com tanto detalhe e tanta curiosidade deixou-me rendida. Apesar de todas as menções (por vezes algo fatídicas) de grandes nomes da literatura, jornalismo, música, entre outros tudo empalidece quando viajamos pelas ruas de Paris na companhia de Dufrénoy.

Quanto às personagens, confesso que não desgostei de nenhuma em particular. Verne alicercou-se um pouco em estereótipos (o sonhador, o trabalhador, o calculista, o conformado, a bela donzela) mas a verdade é que se nota algo mais nas personagens. Pena é que Verne não o explora, focando-se no mundo e dessa forma despindo as personagens de algo que as destaque. Nesse contexto são certamente dos pontos mais fracos do livro.

A escrita do autor é bastante directa mas suficientemente rica para nos imergir na Paris do século XX que o autor tão bem imaginou. Já em termos de história, como mencionado acima, deixa um pouco a desejar, mas essa é uma questão de estrutura e não narrativa.
Os diálogos são muito 'literários', talvez mesmo pouco naturais, mas se tivermos em conta que tal deveria ser comum na época em que este livro foi escrito, torna-se aceitável. Talvez Verne não tenha percecionado de forma tão marcada que também a língua, assim como o mundo, evoluem por vezes muito rapidamente. Ainda assim, não são diálogos incómodos e chatos, apenas... formais.
Também deixo uma nota para a introdução de Richard Howard que é interessante na forma como apresenta o autor, a sua obra e o contexto histórico em que este livro se insere. Ainda assim, pareceu-me algo morosa. Talvez se fosse um pouco mais sucinta, fosse ainda mais interessante.

Para terminar, este é um livro que gostei de escutar (pois 'li-o' em formato audiobook) e que me deixou o interesse para ler mais do autor. Paris que visitamos nesta história é distópica, mas não deixa de ser bela e é sempre impressionante perceber que este livro foi escrito à quase 150 anos atrás. Um autor a revisitar mas que poderia ter incutido um pouco mais de singularidade às personagens e à trama.

Fábio Vermelho disse...

Romance com temática diferente dos demais de Júlio Verne (tanto, que foi rejeitado por seu editor, Hetzel); mas nem por isso um livro ruim.
Fascinante a forma como Júlio Verne descreve essa Paris de 1960, suas instituições, sua cultura (ou falta de), o modo de pensar da população, os meios de transporte e etc. Apenas acho a história de Michel Dufrénoy meio fraquinha – apesar de eu ter me identificado bastante com o protagonista. Acabei criando um carinho especial pela personagem, mesmo não achando o enredo tãaao bom assim.
Enfim, não me interpretem erroneamente. Repito: o livro não é ruim. Recomendo para quem esteja à procura de um leve romance distópico, bem-humorado e com um fantástico mundo muito bem descrito por um autor de mente tão brilhante como Júlio Verne.

alvaro disse...

é um livro que realmente difere dos escritos mais conhecidos de verne, mas é um livro incrivel, achei ao mesmo tempo profetico e biografico , o capitulo dez é facinante.