sexta-feira, 11 de novembro de 2022

Tradutores de Jules Verne - JV e a Wikipédia. Onde se Desmonta o Mito do seu Primeiro Tradutor Português

Templo de saber do nosso tempo, a Wikipédia é uma das maiores fontes de acesso à informação e ao conhecimento na era digital. Se esta (muito) parcial Biblioteca de Alexandria existisse no seu tempo de vida, Jules Verne não só ter-se-ia perdido, maravilhado, dias a fio pelas suas páginas, como certamente lhe teria sido muito útil como ferramenta de pesquisa para a escrita das suas obras.

Porém, dado que qualquer utilizador registado pode editar o conteúdo de uma página, pelo menos na sua versão portuguesa, a enciclopédia livre nem sempre está livre... de mitos. É o caso deste que se encontra na página da Wikipédia dedicada a Mariano Cirilo de  Carvalho [https://pt.wikipedia.org/wiki/Mariano_de_Carvalho].


Mariano Cirilo de Carvalho (1836-1905)


Nela pode ler-se textualmente: "Foi o primeiro tradutor para português das obras de Júlio Verne". E como uma mentira muitas vezes repetida torna-se (uma falsa) verdade, esta afirmação tem feito o seu caminho pelos diversos motores de pesquisa da internet e ajudado a alimentar um mito reproduzido em várias páginas da web [https://toponimialisboa.wordpress.com/2017/09/27/a-rua-do-conselheiro-mariano-de-carvalho-professor-da-escola-politecnica/] e, inclusive, em alguns artigos científicos dedicados à presença de Verne em Portugal.

É quase impossível saber como começou a circular a ideia de que coube a Mariano Cirilo de Carvalho iniciar o público português na obra de Verne, mas há uma hipótese plausível: o livro de memórias publicado pela sua filha, Maria da Conceição da Cunha Carvalho. Terá nascido aqui o mito?


1946, Lisboa Ottosgráfica

A resposta é: não. Eis as fotos das duas únicas páginas da obra em que se faz referência a Verne.




Em nenhuma delas surge a afirmação de ter sido Mariano de Carvalho o primeiro tradutor português de Jules Verne. 

Mariano de Carvalho foi, efectivamente, uma figura bastante activa na vida pública portuguesa da segunda metade do século 19, tanto no jornalismo como na política, além de ser um reputado lente (a designação à época para professor universitário) de matemática na Escola Politécnica de Lisboa. 

Como tradutor de Verne, se de alguma competição se tratasse ou se algum pódio houvesse, o pretensamente afamado "primeiro tradutor português" do escritor francês não chegou à meta em primeiro, nem sequer em segundo lugar. Foi responsável, sim, pela tradução da sexta e da sétima obras Vernianas a serem editadas em Portugal, Aventura de Três Russos e Três InglesesViagem ao Centro da Terra A Galera Chancellor em 1875. Traduziu, posteriormente, O País das Peles (1877). 

Nos posts seguintes, de uma vez por todas, vamos desvendar o enigma do(s) primeiro(s) tradutor(es) português(es) de Jules Verne.

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